Relatório dos trabalhos da Sociedade Espírita de Bordeaux
Variedades
O ÓPIO E O HAXIXE

(2o artigo – Vide a Revista de agosto de 1869)

Conforme o desejo que expressamos no último número da Revista, vários dos nossos correspondentes se dignaram estudar a questão tão interessante concernente às diversas formas de embriaguez a que pode estar submetido o ser humano, e nos transmitiram o resultado de suas observações. Como a falta de espaço não nos permite publicar todos esses documentos, dos quais, todavia, tomamos boa nota, limitar-nos-emos a chamar a atenção dos nossos leitores sobre o Relatório dos trabalhos da Sociedade Espírita de Bordeaux durante o ano de 1867 38, que, em suas páginas 12 e 13, contém reflexões muito judiciosas e bastante racionais sobre a embriaguez perispiritual provocada nos desencarnados pela absorção dos fluidos alcoólicos.

Reproduzimos igualmente uma instrução obtida sobre o mesmo assunto num grupo de Genebra, por nos parecer encerrar considerações de grande profundeza e interesse geral. 38 Brochura in-8; preço: 60 c., franco: 70 c. – Paris, Livraria Espírita, 7, rue de Lille.

(Genebra, 4 de agosto de 1869 – Médium: Sra. B.)

P. – A embriaguez do homem dominado pelo abuso dos licores alcoólicos assemelha-se às desordens provocadas pela superexcitação ou pelo esgotamento do fluido locomotor que anima o sistema nervoso? – Não é também uma embriaguez especial a divagação momentânea do homem ferido subitamente em suas mais caras afeições?

Resp. – Efetivamente, há três espécies de embriaguez no encarnado: a embriaguez material, a embriaguez fluídica ou perispiritual e a embriaguez mental.

A matéria propriamente dita encerra uma essência que dá vida às plantas, e esta essência circula em seus tecidos por meio de um sistema de fibras e de vasos de extrema delicadeza; poderse- ia, com toda razão, chamar essa essência de fluido vegetal. Não obstante sua perfeita homogeneidade, ele se transforma e se modifica no corpo que ocupa e, à medida que desenvolve a planta, lhe dá uma forma material, um perfume e qualidades de natureza e potência diversas. Por isso a rosa não se parece com o lírio, nem tem o seu perfume, nem as suas propriedades; a espiga de trigo não tem a forma da videira, nem seu gosto, nem suas qualidades. Podese, pois, determinar em três formas bem distintas as relações das plantas com o fluido geral, que as alimenta e transforma conforme a sua natureza e o objetivo a que são chamadas a preencher na escala dos seres animados. Esta mesma lei preside ao desenvolvimento de todas as criações, daí resultando um encadeamento ininterrupto de todos os seres, desde o átomo orgânico, invisível ao olho humano, até a criatura mais perfeita. Em seu estado normal, cada ser possui a quantidade de fluido necessário para constituir o equilíbrio e a harmonia de suas faculdades. Mas o homem, pelo abuso dos licores alcoólicos, rompe o equilíbrio que deve existir entre seus diversos fluidos; daí a desorganização de suas faculdades, a divagação das idéias e a desordem momentânea da inteligência; é como numa tempestade, em que os ventos se cruzam e se elevam turbilhões de poeira, rompendo por um instante a calma da Natureza.

A embriaguez fluídica ou perispiritual é a conseqüência da infusão na economia dos perfumes das plantas e da absorção da parte semimaterial, eteriforme, dos elementos terrestres. Os narcóticos e os anestésicos estão neste número; por vezes provocam insônia, mas em geral provocam visões, sonos profundos nem sempre com despertar. Poder-se-ia dizer que o perfume é o perispírito da planta e que ele corresponde ao perispírito do homem. O uso excessivo de perfumes dá mais expansão ao laço fluídico, tornandoo mais apto a sofrer as influências ocultas, mas o desprendimento provocado pelo abuso é incompleto, irregular e traz perturbação na harmonia dos três princípios constitutivos do ser humano. Assim, poder-se-ia comparar o Espírito a um prisioneiro que se evade e corre ao acaso, aproveitando mal o momento de liberdade, que teme incessantemente perder. As visões conseqüentes à embriaguez fluídica não são completas nem contínuas, porque já existe equilíbrio nos fluidos reguladores e conservadores da vida.

A embriaguez mental é provocada por abalos morais violentos e inesperados; a alegria e a dor podem ser os seus promotores. É possível estabelecer uma analogia longínqua entre essa embriaguez e o que se passa na planta que, além da sua individualidade e de seu perfume, possui propriedades, que conserva e que pode utilizar, quando não pertence mais à Terra. Pode curar ou matar. A violeta, por exemplo, acalma as dores, enquanto a cicuta provoca a morte. As plantas venenosas são alimentadas pela parte impura do fluido vegetal. Todo fluido viciado, seja qual for a secção anímica a que pertença, provoca desordens, quer no corpo, quer no Espírito. Uma impressão muito viva de alegria ou de dor pode dar originar à embriaguez mental, e um abalo semelhante pode restabelecer o equilíbrio momentaneamente rompido, assim como a ingestão na economia de um elemento nocivo pode, em certas circunstâncias, ser um contraveneno para um elemento da mesma natureza.

Mas, admitindo a existência dessas três formas de embriaguez – material, fluídica e mental – devemos acrescentar que as três formas jamais se apresentam isoladamente à vista do observador. Um estudo superficial permite, conforme os efeitos produzidos, reconhecer a natureza da causa determinante, mas, em todos os casos, as desordens atingem, ao mesmo tempo e mais ou menos gravemente, o Espírito, o perispírito e o corpo. Talvez se pudesse dizer, com alguma razão, que a loucura moral é uma embriaguez mental crônica.

Em outra parte, voltaremos a esta questão interessante para o médico e para o psicólogo, este médico da alma.

Um Espírito

A LIGA DO ENSINO

CONSTITUIÇÃO OFICIAL DO GRUPO PARISIENSE

(2o artigo – Vide a Revista de julho de 1869)

Num dos últimos números da Revista julgamos por bem anunciar aos nossos leitores a constituição imediata e definitiva do Grupo Parisiense da Liga do Ensino. Hoje nos sentimos felizes por dar a conhecer o programa desses homens devotados, que querem consagrar-se ao desenvolvimento da instrução, sobretudo entre as populações rurais. Aplaudimos sua generosa tentativa e fazemos votos por que seja coroada de pronto e integral sucesso.

Não poderíamos testemunhar melhor a nossa simpatia aos trabalhos da Liga, do que reproduzindo os seguintes extratos das últimas circulares publicadas pelo Círculo Parisiense. Deixaremos que os nossos leitores apreciem o espírito metódico e prático que presidiu à redação desse programa.

“Foi criada uma Sociedade em Paris, sob o título de Círculo Parisiense da Liga do Ensino, com o objetivo de propagar a instrução. É principalmente às populações rurais que ela se dirige. Provoca e estimula a iniciativa individual para a fundação de
escolas, cursos gratuitos, conferências públicas e bibliotecas populares; não se ocupa senão de disseminar as noções mais elementares e mais gerais, não se permitindo entrar em discussões políticas ou religiosas. Espera-se que a Liga, que já conta na França importantes e múltiplos Círculos, veja crescer diariamente o número de seus adeptos, e que se possa encontrar, na própria Paris, um centro de ensino.

“Respeitando a vontade livremente expressa de um grupo fundador qualquer, o Círculo Parisiense oferece seu concurso desinteressado; ele aspira a pôr em comunicação os pontos extremos do país; responde a questões, auxilia as individualidades e se abstém de toda pressão.

“O Círculo Parisiense coloca-se gratuitamente à disposição dos que decidirem organizar uma escola, um material científico, e os guia na escolha dos melhores instrumentos, sejam cartas, globos, aparelhos de física, etc. Aos que quiserem dotar sua comuna de uma biblioteca, o Círculo Parisiense pode oferecer os catálogos dos editores franceses e estrangeiros, e dar seus conselhos, caso se os reclame, para a formação de catálogos especiais destinados ao uso dos leitores, quer pertençam a uma população industrial, quer a uma população agrícola. A isto juntará seus donativos em dinheiro, tanto quanto o permitirem os seus recursos.

“O Círculo publicará um boletim, assim que estiver em condições de fazê-lo, para dar conta dos resultados obtidos.

“Obra de propaganda e de fraternidade, o Círculo busca a luz visando ao interesse geral. Solicita, pois, a expressão das necessidades intelectuais coletivas; esforçar-se-á por provê-lo na medida de seus recursos...

“O Círculo Parisiense da Liga do Ensino, fundado em 1866, acaba de constituir-se definitivamente. Conta hoje 450 aderentes que subscreveram uma soma anual de 2.300 francos.” 39

R.E. , setembro de 1869, p. 385